por Oldemar Olsen Jr.
Foram a economia do traço e a leveza do desenho, marcas registradas do arquiteto Oscar Niemeyer que me detiveram no texto. Tudo muito simples como são as coisas boas. Com uma história por trás, misto de sonho, força de vontade, obstinação e também um apoio subliminar de gente que entendeu todo esse esforço e aderiu à luta, mostrando caminhos, abrindo portas e principalmente, acreditando junto. O cidadão brasileiro chama-se Evando dos Santos, casado com Maria José Lima, tem dois filhos e um cachorro chamado Dody. Pedreiro de profissão, nascido em Aquidabã, no interior de Sergipe. Aprendeu a ler aos 18 anos para entender os salmos da bíblia quando se converteu na Igreja Batista. Chegou ao Rio de Janeiro com 27 anos. No fim dos anos 1980 e foi trabalhar na urbanização do conjunto favelas da Maré, no Bairro Bonsucesso, e depois, incentivado por um amigo, passou a ler nas horas vagas, obras de Machado de Assis, José de Alencar e Monteiro Lobato.
Evando se apaixonou pela literatura e decidiu montar uma grande biblioteca em sua casa, mas que deveria ser comunitária. Começou a arrecadar livros, usados, velhos, todos doados. Não tinha tempo feio com ele, jamais recusou carregar imensos sacos de livros mesmo tendo de andar em ônibus atulhados. Depois de dez anos na função, conseguiu amealhar 55 mil livros. Com ajuda de amigos que perceberam que aquela obsessão não tinha limites, conseguiu chegar ao Ministério Da Cultura e obter o certificado que lhe permitiu captar recursos para construir a sede da biblioteca, num terreno próximo a sua casa. Foi assim que ganhou R$651 mil de financiamento do BNDES. Os recursos só chegaram depois que Oscar Niemeyer enviou um desenho do que ele pretendia. Mas não foi fácil, ele conta que um dia chegou em casa e viu na televisão um programa com Oscar Niemeyer, e não teve dúvidas, ligou para a produção e foi posto no ar, ao vivo, falando com o maior arquiteto brasileiro, quando então solicitou um projeto para a sua biblioteca. Niemeyer se entusiasmou com o idealismo de Evando, e ficou sensibilizado com sua luta, prometeu ali mesmo que atenderia ao pedido. Passaram-se dois anos, e finalmente, pode contar com um esboço assinado por Niemeyer, de sua tão acalentada biblioteca. A coisa toda ganhou notoriedade a ponto de Evando receber a participação do então ministro da cultura, Francisco Weffort que esteve visitando-o na Vila da Penha, no Rio de Janeiro, antes de iniciar a construção, orientando-o para atender às exigências legais da doação do Fundo Nacional de Cultura e do registro na Lei Rouanet, na época. Hoje a Biblioteca Comunitária Tobias Barreto de Meneses já está funcionando e conta com um auditório, salas de leitura e salas de aulas para cursos de idiomas (espanhol, inglês, francês, alemão e italiano) além do acervo que está separado pelo nome da coleção, assunto, autor e data de publicação. O prédio está dividido em três pavimentos, o térreo, de frente para a rua, abriga o acervo de livros. E, segundo soube, sobrou espaço até para uma instigante “sala de terapia livresca” onde o usuário, crianças normalmente, sente o cheiro dos livros, aprendem a apreciar uma obra e relaxam ouvindo e compreendendo as histórias que são contadas ali. No acervo também se encontram raridades, como uma edição de Os Lusíadas, de 1805 e até a primeira história do Brasil, escrita pelo inglês Robert Southey, editada em Londres em 1810. Mas ele ainda não desistiu, agora quer criar um curso de letras com professores aposentados... Sabe, por causa dessas pessoas que esse Brasil vale à pena, de gente que ainda acredita que é possível fazer esse mundo melhor e mostra isso com ação, contra a qual não há argumentos, pelo menos não essa daí!
Olsen Jr., escritor catarinense, mora em Florianópolis. |